sexta-feira, setembro 19, 2008

O presente no futuro

O tempo passou. E passou daquela sua forma inevitável: Ao mesmo tempo rápido e devagar demais.

Por um lado, gostaríamos de ter feito as coisas de modo diferente. Não exatamente virar as coisas do avesso, mas trocar uma cor por outra, uma pitada de tempero por outro, enfim, mudar as pequenas coisas. Não o enredo da história, nem os atores, nem o cenário; O figurino, talvez. Não me faço entender, não é? Sensações as vezes são assim, como sonhos, não fazem sentido completo; Nem existem para tal.

Por outro lado, gostaríamos de contar a história com absoluta fidelidade, relembrar as coisas exatamente como aconteceram, com seus figurinos exatos, e ter em nossas recordações nada além de absoluta fidelidade aos fatos passados.

Neste momento, onde nos encontramos, tudo isto fica embaralhado, e sensações contraditórias se apresentam, recordando de imediato as lembranças do tempo em que tudo era confuso, onde dúvidas graves se apresentavam e nossos impulsos impensados produziam resultados incessantes, mais ou menos bons, conforme o acaso, se assim podemos nos exprimir.

Toda esta confusão juvenil, as dúvidas, os receios, e também aquelas certezas ingênuas, daquele tipo que nos faz acreditar que as coisas por si mesmas vão dar certo, apesar de não termos metas ou planos. E as coisas deram certo para nós, talvez por quê fomos fixamos metas de curto prazo após descobrir que ao menos isto precisávamos, se futuro mais longo não se apresentava possível. É, os adultos, em sua grande maioria, cansam de sonhar. Alguns reaprendem, constrangidos que são a relembrar que os sonhos são o sal, e o tempero mesmo da vida; Além de sua força construtiva, quando associados a vontade e a persistência.

Mas logo nosso pensamento retorna ao presente, e estas sensações do passado são somadas, num piscar de olhos, com as experiências, nem sempre fáceis, que a vida nos trouxe após este período de infância relativa, sim, pois um jovem adulto é criança em aprendizagem, quando comparado ao adolescente maduro que o segue, que, por sua vez, também é criança comparado com a próxima fase.

Vivíamos a vida do corpo, permitindo-nos fazer nossa imagem como a deste, e a interpretar as fases biológicas como um período contínuo de mudanças lineares, envelhecendo um pouco a cada dia e encontrando por fim a decrepitude, a falência dos órgãos e a morte.

Mas a verdade é que a vida da alma não é linear. Há dias, somando séries de centenas deles, talvez, em que muito pouco muda, quase nada. É fato que para o intelecto, sempre há progressos, ainda que mínimos, pois os problemas sempre se apresentam com novas roupagens, pedindo novas soluções. Mas em nossas percepções e decisões, naquilo enfim que nos constitui e nos define como humanos, e não como máquinas; No cerne daquelas propriedades que temos, sobre as quais os escritores não sabem escrever, os filósofos não sabem pensar e os demais de nós, homens vulgares, ignoram existir, enfim, nas questões que hoje, passado todo este tempo, vemos como as mais importantes e as que mais desprezamos, nestas questões, muito pouco avançamos, se olhamos a passagem do tempo como uma sucessão de dias.

Não, não é no estudo diária das "matérias" da vida em que aprendemos, pois não há este estudo, ao menos não de forma voluntária. Há dias em que situações externas a nossa vontade (ou talvez também por consequências tardias e indesejadas desta) nos induz a "prova" de nossos progressos. E é ali, na hora da prova, do exame, que estudamos, semelhante ao aluno relapso que preocupa-se com a nota no exame, mas não o suficiente para se dispor a preparar-se de antemão para este.

É de sopetão, nos momentos de aceleração, em que as substâncias inertes de nossa alma fervem, despertam, movimentam-se.

Somos ainda cubos de gelo por derreter-se, e hoje, passado este tempo, recordamos destes momentos com certeza de que poderíamos ter feito mais.

Tudo isto recordo neste ponto do presente (que é em verdade futuro), onde te encontro e recebo as recordações de nossos caminhos, outrora separados, que hoje se reunem.

As lembranças são como um vilarejo no vale, e conforme subimos a montanha do tempo, a sua imagem fica vaga, distante. Ao longe a grande imagem vai tornando-se menor, os detalhes desaparecem e o que era Lar, vira um distante horizonte.

Mas as sensações, as lembranças que gravamos n'alma e não nos olhos, estas ficam por mais tempo, pois são mais vivas, mais profundas.

Os reencontros com os que nos são caros que se afastam por muito tempo trazem, inevitavelmente, estes reencontros conosco mesmo, com aqueles valores do passado do qual se os alteramos, jamais os esquecemos inteiramente.

Nos encontramos com aquele jovem sonhador que fomos, e que só hoje começamos a apreciar com justiça.

Pesquisa google