De repente bateu uma vontade de escrever, como antigamente. Me falta a inspiração, aquela espécie de chacoalhada nos neurônios, a inundação de idéias. Isto me falta.
Mas deu vontade de escrever. Escrever sobre coisas que as palavras não transcrevem muito bem. Eu sempre digo isso, e aqui já escrevi várias vezes, que há coisas que as palavras não traduzem.
Há coisas que as nossas melhores expressões não transmitem adiante, num determinado momento. Mas ignoramos se, algum dia, não teremos melhores capacidades de nos expressar, de fazer entender estas coisas, que sentimos e pensamos, para as quais palavras não foram feitas, ainda.
Por exemplo, eu pensava, e, de certa forma, sentia, como é difícil encontrar plenitude. Como a gente está sempre trocando de metas, correndo atrás de não-sei-quê, fazendo escolhas objetivas: optamos por determinada coisa, em detrimento de todo o mais. Bom, algumas pessoas conseguem balancear melhor seus interesses e afazeres. Eu não. Eu evito fazer escolhas firmes, mas quando as faço, as faço em detrimento de todo o resto, doa a quem doer. Na verdade, não é que eu queira adotar uma postura inconseqüente ou míope, é que eu me envolvo de tal maneira com os objetivos que imagino necessitem de toda a minha atenção, que acabo ficando só nisso, ou, ainda, só na idéia de que preciso focar, e acabo focando na idéia, e não no objeto dela.
(Confuso né. Mas eu avisei que não haviam palavras pra expressar com exatidão. Aliás, existem, mas eu não as possuo, ainda. Uma coisa de cada vez).
O que eu queria mesmo escrever era sobre as escolhas que a gente faz, as metas que a gente idealiza. Minha percepção da sociedade e de suas regras é que esta valoriza muito a objetividade. Valorizar muito as vezes é sobre-valorizar. Dizem que você tem que escolher um objetivo, digamos profissional, colocar a meta lá na frente, e se dirigir a ela como um motorista cego instruído a andar em linha reta (metáfora infeliz, traduzindo: como se devêssemos andar sempre em direção à meta, passando por cima de tudo o que estiver no caminho sem se aperceber disto, e ainda, não ter muita certeza de que caminho usar pra chegar até o pretenso destino; Desculpe, novamente, faltam-me as palavras).
Dentro do parágrafo acima, eu usei a expressão "dizem", quase me excluindo. Mas parte de mim percebe as coisas desta forma. Logo, me incluo, fazendo justiça.
Voltando ao tema, me parece que, agindo assim, de maneira super-objetiva, deixamos de apreciar o caminho. Só importa a meta. De repente, os fins justificam os meios, mas ainda que não chegue a tanto, passamos os dias correndo atrás de não sei quê (sim, eu sei, é a meta, e ela é isso: um não-sei-quê), e acabamos perdendo parte da diversão, que é o caminho.
Não defendo um retorno a subjetividade. Eu acho que ela existe em sobre-abundância até muito mais do que a objetividade ao extremo, aliás, é este o termo: extremo; São estes extremos que me irritam.
É preciso ter objetivos e metas, é preciso empenho, é preciso buscar. Mas é uma ilusão achar que isto nos põe no controle e que, uma vez a meta esteja atingida, tudo vai magicamente convergir para um estado qualquer de nirvana, e aqui não apelo ao conceito original exotérico, mas à sua extrapolação generalizada: para alguns, o nirvana é conseguir um monte de dinheiro.
Aí, de repente, "sucesso": nosso nirvana foi atingido, mas não nos sentimos melhores com isso. Ressentimos do que deixamos pra trás: dos anos de nossas vidas, da atenção que não pudemos (ou quisemos) dispensar aos que nos são (ou nos eram) tesouros, enfim, começamos a colher, tardiamente, a constatação daquela realidade de que o preço real de qualquer coisa, é a soma de tudo aquilo que abrimos mão para consegui-la.
Sinto saudades do tempo em que parecia haver, hmm, tempo, para todas as coisas. Nada era desesperador ou para ontém, simplesmente por quê poderia ser feito hoje com calma, senão amanhã, e a vida seguia seu curso, aproveitando o hoje, as surpresas que a vida trazia (e talvez ainda traga, sem apercebermo-nos).
A respiração era de quem respira o ar do momento, para manter-se, e hoje é a de quem aspira hoje a sua cota de ar de amanhã, tentando acelerar as coisas, fazer mais, como se, de repente, o mundo fosse acabar amanhã.
Idéias esparsas. Não, ainda não escrevo como ontém, talvez não mais escreva. O ontém é o ontém, e d'hoje, 'inda não sei.
Talvez na alvorada de dia claro, abençoado pela luz confortante e pela imagem das folhas nas ruas, voando em milhares ao vento sul, talvez, ah, talvez.
Talvez amanhã eu possa trazer ao hoje um pouco do que fui ontém.
2 comentários:
Talvez amanhã vc escreva :)
Gracinha... :P
É... talvez eu escreva :D
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