quinta-feira, dezembro 08, 2005

Carta à Nação [em protesto]

O que era difícil torna-se fácil, o que era fácil e gratuito, torna-se caro.

A corrupção nos alcancou a todos. É difícil achar quem não condene, acertadamente, o estado de coisas em que se encontra a política em nosso país, e de certa forma, em todo o mundo.

Mas um exame mais autêntico e menos hipócrita de consciência poderá nos demonstrar que a corrupção não começa nos altos escalões, na representatividade pública, e, ainda mais, que os maus exemplos que dão, repassados pelos meios de informação, não são seguidos por alguns de nós diante da perspectiva da impunidade. A corrupção caminha na contramão desta análise, infelizmente tão do senso comum, e segue avançando pelo caminho contrário. Enquanto alguns se armam e se arvoram para punir os corruptos e dar cabo da corrupção onde ela se completa e se consuma, o que é um esforço punitivo que só pode minimizar os estragos depois de feitos, a corrupção continua nascendo em seu leito, onde desenvolve-se em paz, em locações onde cada vez menos parecem existir pessoas dispostas a combater o bom combate, pois são instruídas por irrefletidos a procurarem o mal não onde ele nasce, mas apenas onde ele já se manifesta.

Todos julgamos a podridão do quadro político e institucional, a corrupção que mancha do guarda de trânsito ao gabinete da presidência da república não mais de bananas que constituimos, mas parece que se fossemos neste caso seguir o hábito contestável de colocar os ladrões de galinha na cadeia enquanto os de colarinho branco, com bons advogados, continuam a solta, teríamos que começar a limpa encarceirando os juízes da situação: não tanto os de toga, mas nós mesmos, que julgamos o quadro como sendo a corrupção alheia, por que a verdade é que todos somos corruptos, em maior ou (queira Deus) em menor grau.

Quando abrimos nossas empresas, quer no fundo de quintal ou em sintuosas instalações, e não escolhemos não recolher nossas taxas, impostos, e contribuições (que se alguém afirmar serem excessivas, quase um assalto, terão meu apoio), estamos sendo corruptos acomodados e cavando nossas próprias covas. Quando um novato guarda de trânsito vê-se diante de uma falta grave ou gravíssima, e, tendo o dever de multar (visto que a advertência já não cabe), aceita suborno, quem é o corrupto? Ele apenas, ou será que aquele que o suborna não acaba de criar um corrupto? As vezes são necessários os anos e as duras provas para forjar o caráter de alguém, tarefa impossível se a corrupção chega antes da instrução adequada.

Digo que somos corruptos acomodados por que escolhemos, sozinhos, tomar tais atitudes, usando como desculpa os outros: "todo mundo faz, se eu não fizer eu quebro", mas a verdade é que se existisse maior organização por parte de empresários e consumidores, os impostos não seriam tão altos. Vai dizer que muitos daqueles que estão lá decidindo qual a carga tributária não foram eleitos por voces que hoje reclamam deles?

Nós elegemos um modelo de democracia representativa mas levamos o conceito muito a fundo: votamos em qualquer babaca e depois nos tornamos passivos ao que acontece, como se o problema fosse dele e não nosso. Mas não é ele quem paga a conta.

Quando a coisa dá errada, criticamos o "babaca", o depomos, e colocamos outro "otário" no lugar, mas ótarios somos nós, pois a situação prossegue, e tem que ser assim, por uma simples razão: os problemas do país são estruturais. Não é a dívida em si, nem os juros, nem o câmbio, nem os partidos de esquerda, nem os de direita ou de centro. Não é explodindo Brasília ou exportando os preceitos de São Paulo ou Rio de Janeiro (capitais) para o resto do País, nem vendendo a Amazônia legal brasileira aos estrangeiros ou expulsando eles dela, nem nenhum destes simplismos que resolverá qualquer problema. Não é escrevendo textos inúteis como este, ou pior, fazendo a grande e pesada tarefa de repassar e-mails com as mesmas tolices para sua lista de amigos, que você irá contribuir com alguma coisa, e me acredite, se o resto do país contribuir com alguma coisa e você não fizer além destas coisas que já vem fazendo, ainda teremos um problema. Temos muita atividade mental "copiar, colar e passar adiante" neste país, mas muita ociosidade no que concerne a reflexão real e ações práticas.

O problema também não é uma questão de forjarmos um nacionalismo incompatível com os tempos e a origem cultural brasileira, embora ele passe sim por uma falta de identidade nacional. É necessário que os filhos de uma nação se reconheçam como tal e assumam as consequências daí decorrentes, mas discordo veementemente do nacionalismo orgulhoso e tolo ensinado em algumas nações desenvolvidas, pois ele não resolve os problemas da nação e menos ainda as do mundo de forma definitiva, apenas os transfere a nações terceiras, através das guerras e demais formas de exploração econômica, política e sócio-moral.

O problema só começa a ser resolvido quando cada um de nós fizermos um passo para melhoramos nossos próprios conceitos, elevarmos o debate além do "eu acho" e dos preconceitos de roda de bar, e finalmente, quando a ensinarmos nossos filhos a pensar, especialmente em coisas como respeito ao semelhante e aos direitos dos demais, pois estas coisas não se aprendem na escola, e nem deveriam: não é papel das instituições de ensino forjar o caráter de nossos filhos. Para termos o que legar aos nossos descendentes, é necessário efetuarmos o trabalho de revisão de nossos valores em nós mesmos, por que muito tolo é aquele que, tendo corrompidos os valores, acha que uma educação hipócrita poderá deixar algo aos seus descendentes. As palavras tem um valor menor do que o que frequentemente se lhes atribui.

O exemplo não é apenas a melhor forma de educar, há quem pense que seja a única. E o exemplo vem, antes de Brasília ou dos institutos educacionais, de nossos lares. O nosso legado às próximas gerações são as nossas ações e omissões bem como suas respectivas consequências.

Alexandre Pereira Nunes - Cidadão Brasileiro

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