domingo, agosto 29, 2004

Meu Irmão

- Mano velho, quanto tempo!
- Pois é caçula, e essa barba na cara? A última vez que te vi, estava cheio de espinhas, colecionava playboy...
- Ainda coleciono...
(Risos)
- É, faz bastante tempo. Como estão os velhos?
- Estão bem, mamãe estava falando em fazer aquela macarronada em homenagem a sua volta.
- Não acredito, ainda lembro do sabor daquela macarronada, e da alegria do pessoal lá de casa reunidos
- Só faltava você mesmo. Papai está bem, machucou a mão no trabalho mas o médico disse que em algumas semanas estará bom.
- É, conversamos ao telefone, ele me pareceu estar encarando numa boa. E as namoradas?
- As dele ou as minhas?
- As suas, claro, nosso pai é sério. Ou você sabe de algo que eu não sei.
- Eu não sei de nada, exceto, que ele, além da esposa, tem uma namorada, e ambas sempre foram a mamãe.
- Gracinha. Agora não fuja do assunto, e me conte.
- Bom, é complicado. Eu estou apaixonado.
- Ah é? Quem diria, você aos 12 anso saiu correndo chorando quando a Dorothy tentou te beijar atrás da porta.
- Eu?? Que absurdo.. Se você contar isto para alguém, te dou porrada.
- É? quer tentar? Moleque... que saudades de você. Mas me fale, quem é a sortuda?
- Não sei se é sortuda, mas é alguém muito especial. Ela se chama Regina.
- Regina... Não era a regina da escola não?
- Não, a conheci na faculdade. Ela cursa medicina.
- Que bom, teremos uma médica na família.
- Ela quer fazer psiquiatria.
- Não me surpreende que ela goste de você.
- Engracadinho.
- Mas me conte, estão namorando?
- Eu não diria isso ...
- Continue.
- ... É complicado, como eu disse. Ela é uma pessoa fantástica, mas tem a faculdade e tudo mais... Além do que, o pai dela não gosta muito da minha cara.
- Mano, a primeira vez que o sogrão me viu, puxou uma espingarda da parede e comecou a limpar na minha frente, perguntando, indiretamente, o que eu queria com a filha dele. Ainda estes dias ele estava com medo de receber os resultados do exame de cancer, e pediu que eu o acompanhasse e mantivesse segredo. Percebe a confiança?
- Entendo mano, me sinto melhor só de saber disto, mas vai saber né...
- Relaxe. Não era você o senhor fé na vida?
- Ah mano, fé é difícil, acho que não tenho mais não.
- Sei... Tá falando quem me ligou as 2 da manhã quando soube que eu havia perdido o emprego, e me convenceu a abrir uma empresa, que hoje está indo muito bem.
- Isto foi antes...
- Antes?
- ... Antes da chacina, das mortes. Segurei a cabeça dos meninos enquanto os bandidos fugiam, dois deles morreram em minhas mãos. Que justiça é essa? Fé em que?
- Você salvou dois deles. Se você não estivesse lá, não teriam prendido os bandidos, e dois meninos não estariam hoje aqui.
- Mas eu podia ter salvo todos... Eu devia ter salvo todos... Não é justo...
- Papai me contou exatamente assim: disse que você se colocou na frente dos meninos e que o bandido iria atirar, mas que quando viu você, desmaiou, por que voce o olhou nos olhos e o reprovou.
- Eu não sei o que aconteceu, foi tudo tão rápido, eu estava tremendo de medo. E alguém atirou, com uma metralhadora, acertou um dos outros meninos que já estavam caídos, foi horrivel.
- Por que você se fixa no aspecto ruim? Você salvou duas vidas. Eu não teria conseguido.
- Dependesse de mim e todos estariam vivos
- Dependeram de você as duas vidas, eu insisto. Vamos esquecer isto um pouco?
- Preciso visitar aqueles meninos, ver como eles estão. Você vêm junto?
- Com todo prazer. Mas antes vamos a macarronada, antes que a mamãe mande nos prender.
- Com toda certeza. Mano, eu senti muito a sua falta. Sem você não é a mesma coisa.
- Eu também, caçula, eu também. Mas estarei por aqui agora, e não pretendo partir tão cedo.

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