Lembram que há algum tempo escrevi sobre o mar, e como seria bom ir vê-lo? Pois fui. Meia noite e meia, eu com sono, indo p/ casa, quando de repente cruzo a estrada que me levaria ao mar, e algo ressona em minha cabeça, como um eco, uma voz distante porém muito forte, que pergunta: - por quê não?
E lá fui eu. Seria uma tranquila viagem de Curitiba a Guaratuba, que foi o que me pareceu mais apropriado, já que dá perto de 100km. Indo a uma média de 90 km/h, eu praticamente não ia gastar combustível. E de fato, exceto que peguei neblina e chuva boa parte do percurso, e que a neblina estava tão densa que tive que colar na traseira de um caminhão e desligar os faróis (assim eu podia enxergar a estrada com os faróis do caminhão, pois os meus ofuscavam a vista. Se eu fosse com meus faróis, arriscava eu seguir o caminhão p/ fora da pista, se ele errasse o caminho).
E tudo foi quase como o planejado, até que eu passei na entrada para Itapoá, e movido por um instinto aventureiro, outro pensamento me passou pela cabeça: - já que estou aqui mesmo ...
Entrei. Rodei aquilo tudo de madrugada praticamente sozinho, eu e uns poucos carros vindos na direção contrária, mas nenhum sequer na minha frente, ou atrás... Só algumas bicicletas no caminho, o que me é dificil imaginar, nos dias de hoje, ser tranquilo, mesmo possível, andar de bicicleta perto das 3 da manhã...
Rodei perto de uma hora, naquela estradinha esquisita que corta Itapoá, em grande parte do trajeto era a unica via pavimentada, e ainda assim, com trechos incompletos.
Cheguei ao final dela, e ela dava em uma estradinha de terra. Dessas com pedras. Segui. Fui parar em algo que lembrava um cruzamento, com placas estranhas, tive que abaixar o vidro para conseguir lê-las. Dizia ferry boat. Segui por ela. De repente não era mais estrada de pedra e barro, era estrada de lama, lisa, sem pedras. Pensei que não devia ser possível passar por ela de carro, mas passei. Passei por duas pontes daquelas safadas que você pensa: "esta porcaria vai cair quando eu passar por cima dela".
Segui por mais ou menos hora e meia por um estrada cujos melhores trechos não comportavam que se fosse a mais de 65 km/h. Lama pura. Eu e um jipe e teria sido algo interessante. Em alguns instantes o carro saia da pista, na lama, e por alguma razão inexplicável, aparentemente meus instintos sabem dirigir na lama, vê se pode. Reduzia a marcha, deixava encaixar no sentido favoravel a sair da pista, jogava p/ o outro lado levemente acelerando, e pronto, eu estava no meu rumo de novo. Meu medo era que o carro "quisesse" sair de traseira, e de fato quis sair, mas na velocidade que eu estava era contornável... Ainda tenho muito a aprender.
A estrada termina num lugar para atracar uma balsa. Abaixei o banco e dormi por ali, sem antes me perguntar que cena curiosa: Só eu, o mar e ... faltaram as estrelas! O céu estava encoberto. Mas uma sensação de pânico e de prazer se misturavam, eu estava sozinho, com a natureza, quase 5 da manhã, no meio do nada. Desliguei o rádio, e ouvi o som ao redor. O mar (na verdade, não era um trecho de mar aberto, era a entrada de uma baia) lambia as pedras e fazia um barulho muito engraçado, era quase um ruído silêncioso. Haviam sapos coachando e outros bichos que de vez em quando passavam correndo no meio do nada e praticamente não faziam barulho.
As vezes eu tinha a impressão que haviam pessoas por perto, por causa de certos ruídos. Mas não, nada, ninguém. Fiquei contemplando esta sensação de medo e poder por uma meia hora, aí dormi. Acordei, então, as 6. Tomei um pouco d'agua, e tentei ficar acordado. Numa placa dizia que a balsa passava as 6:30. Às 6:20 ela ancorou. Desceram dela uns 3 carros e um caminhão, e depois eu embarquei. As 6:25 a balsa partiu, afinal, de passageiro só tinha eu. Pela cara do povo da balsa, ninguém fazia este trajeto, naquele sentido, e naquele horário, há um bom tempo.
Segui para Joinville. Joinville é uma cidade curiosa. Uma parte dela parece uma típica cidade de interior catarinense, outra parte dela parece uma cidade feia, dessas mal desenvolvidas e nem de longe planejadas.
Rodei por mais ou menos uma hora, e decidi voltar. Peguei a 101, depois 376, chuva por todo o percursos. Cheguei em casa perto das 9:30, e fui direto p/ cama.
Foi uma divertida experiência egoísta, acho que minha primeira viagem aventureira realmente sozinho. Já viajei um bocadinho de carro, mas as vezes que fui sozinho, foram de dia e em trechos pequenos.
O interessante é que eu, representante mor do egoísmo na terra, não me senti inteiramente satisfeito com os resultados da viagem. Certamente que foi ótima e estou feliz por tê-la feito, mas teria sido muito melhor se eu pudesse dividi-la com alguém.
Chega uma época na vida em que nossos trunfos nada valem, se só se aproveitam a nós mesmos. Acho que estou beirando esta época, se é que já não estou nela. É complicado, tudo acontecendo ao mesmo tempo, em alguém que paralisou alguns aspectos da vida por tempo demais.
A vida é mesmo curiosa. E se torna assustadoramente interessante, quando te encontras a sós com tua consciência, no meio do nada, de madrugada, numa estrada deserta que descamba em um atracadouro que eu apenas sabia que teria uma balsa, nem sabia para onde esta iria.
Acho que este mundo barulhento faz de tudo para que não fiquemos a sós conosco mesmos. Conheço pessoas que não conseguem estar em silêncio. Ligam a tv, o rádio, até para dormir. E só dormem quando estão exaustos, parece que assim não tem que pensar em nada, basta dormir, e a rotina continua no dia seguinte.
Conheço bem este medo, de por a cabeça no travesseiro, e se perguntar: - Que estou fazendo de minha vida? Será que me perdi, no meio das obrigações e da rotina, e já não sei quem eu sou? Será que tenho coragem de me olhar no espelho, face a face, e me perguntar: quem é você?
Quem é você, Alexandre? Você, que ora equilibra duas forças que se contrapõe, ora é esmagado por qualquer uma delas. Que harmoniza o que não pode ser harmonizado, para depois desequilibrar o que já estava balanceado? Ora, o mediador, ora o gerador de conflitos. Quem é você?
Por que, Alexandre, as vezes, no meio de uma multidão de um milhão de pessoas, sente uma solidão profunda que o destrói, e as vezes, no meio do nada, sente-se bem acompanhado, por aqueles que carrega consigo em seu coração?
Fiat Anima, protótipo. Deixa o futuro ser presente. Deixa o mundo ser o mundo, e permite-se ser.
Nosso maior inimigo, por vezes, somos nós mesmos. Nosso medo, nossa preguiça, nosso comodismo. É comodo estar em cima do muro. É fácil não pensar. É facil imitar. E imitar é válido e necessário, porém insuficiente.
O jeito é ir além ...
Bom fim de semana :-)
P.S..: O fato de eu ter escrito o texto anterior na segunda pessoa do singular produziu um efeito curioso. Não quero usar vocês de cobaias, mas eu realmente queria testar esta forma e aparentemente ela funciona bem, embora não como o esperado :-)
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